Nasci num 3.º andar da Rua das Padeiras, numa Baixa repleta de vida, zona humilde de gente laboriosa, tabernas e outros estabelecimentos comerciais, meretrizes e artesãos. E ali vivi até quase aos 24.
Da janela do meu quarto olhava o mundo inteiro, a Torre lá no alto com o relógio que comandava a vida a-meias com o sino de S. Bartolomeu. Via desde a Conchada ao Governo Civil, telhados sobre telhados, o Colégio dos Órfãos imponente mesmo depois de ter ardido, a cúpula da velha Sé. E uma ou outra palmeira.
O bilhete de identidade (dos antigos, felizmente) é um dos meus tesouros. Os nomes do pai e da mãe, heróis de sempre, e a freguesia de naturalidade: S. Bartolomeu. Muito poucos (até hoje só conheci dois ou três) se podem orgulhar deste “topónimo” no documento que lhes reconhece a cidadania.
Quantas vezes afirmei, ao longo da vida, que «Sou de Coimbra, mas não sou da Sé Nova. Sou de S. Bartolomeu!». Ou S. Bartolo…nosso, como dizíamos os que lá morávamos nesses inesquecíveis anos de 60 e 70, repetindo a expressão do saudoso padre Nunes Pereira, o “meu padre”, como escrevi por altura da sua morte; o nosso padre.
Agora, na dita reorganização administrativa que tem tanto de caricato como de cobardia, mataram-me a freguesia. E eu, praticamente, nem dei conta disso. Só hoje, ao entrar no “portal das Finanças”, fui confrontado, olhos nos olhos, pela primeira vez, com a extinção da freguesia em que nasci. E entristeci.
Mataram a freguesia de S. Bartolomeu. Mataram um pouco de mim.
Tenho estado de costas voltadas com o Dr. Mário, mas desta tenho que lhe dar razão. “A razão a seu dono”.
Bom a hoje União de Freguesias de Coimbra, que juntou, Almedina, S. Bartolomeu, Santa Cruz e Sé Nova, vêm a todos os que nasceram em alguma destas freguesias, como é o meu caso em S. Bartolomeu, obriga a um requerimento, que já está em cima de prazo, á Conservatória dos Registos Centrais de Identificação Civil e Criminal, afirmando a vontade de manter a designação da freguesia de origem nos seus documentos, no caso de omissão passa-se a ser cidadão nascido na UFC. Não sou contra a uma nova divisão administrativa, mas dava jeito que tive sido feita por alguém que soubesse “da poda” e não produzisse a baralhada em que se está.
Jorge Antunes