18.2 C
Coimbra
Quinta-feira, 1 Junho, 2023
InícioDESTAQUESexo e outras deficiências!...

Sexo e outras deficiências!… [Salvador Massano Cardoso]

web-homossexualidade

SALVADOR MASSANO CARDOSO *

Diz Fernando Sebastian, futuro cardeal, que «a homossexualidade é uma forma deficiente de exprimir a sexualidade, porque esta última tem uma estrutura e um objetivo que é a procriação». Ainda por cima, o senhor compara esta “deficiência”, homossexualidade, com outra “deficiência”, a hipertensão de que sofre e que, como tal, tem de corrigir.

Mal sabe o senhor que muitas doenças que atingem o ser humano e, também, os animais, são a tradução de fenómenos adaptativos que permitiram que chegássemos onde estamos, ou seja, o que está na base da hipertensão, por exemplo, são mecanismos que permitiram há centenas de milhões de anos a saída dos animais do meio hídrico para poderem viver em terra. Mal sabe o senhor que certas doenças metabólicas, as tais “deficiências”, segundo o seu juízo, que são muito prevalentes hoje em dia, caso da diabetes, hipercolesterolemia e obesidade, não são mais do que a expressão adaptativa, outrora benéfica e vantajosa em termos evolutivos, mas que agora, face aos estilos de vida que adotámos e ao facto de vivermos cada vez mais, acabam por se manifestar de forma deletéria. Mesmo o facto de conseguirmos chegar a idades avançadas, caraterística da sociedade ocidental, constitui um fenómeno “contranatura” mas que acaba por ser muito agradável ao permitir mais anos de vida, mais anos para aprender e mais anos para amar.

O senhor desconhece que a homossexualidade existe noutras espécies animais, largas centenas, logo, não pode vir a terreiro afirmar que o «objetivo principal e único da sexualidade é a procriação». No caso da nossa espécie não é, serve para isso, naturalmente, mas serve para muito mais, para reforçar laços, sentir a beleza da existência e contribuir para cimentar e perpetuar o amor. Poderia dissertar um pouco mais sobre estes assuntos, mas julgo ser suficiente. De qualquer modo, não posso deixar de manifestar que certas individualidades, ao apontarem para certas “deficiências” na adoção de certos comportamentos, deveriam aprofundar mais os seus conhecimentos.

Para terminar, e dado que se aproxima a hora de jantar – estou com fome! –, penso que o prazer gastronómico deveria ser considerado também como uma “deficiência”. Bastava aos seres humanos ingerirem “matéria orgânica comestível”, que está ao nosso alcance, para satisfazer a necessidade fisiológica primordial que é “matar a fome” e sobreviver. Falo de gastronomia, porque existe, como é fácil de compreender, um certo paralelismo entre o sexo e a alimentação. Para já são os dois mais poderosos motores que garantem a existência do indivíduo e da espécie; em segundo, nós, os humanos, fomos capazes de os transformar em deliciosas fontes de prazer, e há mesmo momentos em que é difícil separá-los…

Vá lá senhor futuro cardeal, trate da sua hipertensão com muito cuidado, não abuse do sal e não permaneça muito tempo à mesa, pode-lhe ser fatal e, quem sabe, se não é, também, na sua perspetiva, mais uma “deficiência” a corrigir… Eu vou corrigir a minha e o quanto antes. Não quero ficar fechado na faculdade. Bom apetite e ótimo jantar para todos.

* Professor universitário. Médico

web-Salvador-Massano-Cardoso

RELATED ARTICLES

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui

- Advertisment -

Most Popular

Recent Comments

Célia Franco on Redacção da TSF ocupada
Maria da Conceição de Oliveira on Liceu D. Maria: reencontro 40 anos depois
maria fernanda martins correia on Água em Coimbra 54% mais cara do que em Lisboa
Eduardo Varandas on Conversas [Vasco Francisco]
Emília Trindade on Um nascimento atribulado
Emília Trindade on Sonhos… [Mário Nicolau]
Emília Trindade on Sonhos… [Mário Nicolau]
José da Conceição Taborda on João Silva
Cristina Figueiredo on Encontro Bata Azul 40 anos
Maria Emília Seabra on Registos – I [Eduardo Aroso]
São Romeiro on Encontro Bata Azul 40 anos
Maria do Rosário Portugal on Ricardo Castanheira é suspenso e abandona PS
M Conceição Rosa on Quando a filha escreve no jornal…
José Maria Carvalho Ferreira on COIMBRA JORNAL tem novos colaboradores
Maria Isabel Teixeira Gomes on COIMBRA JORNAL tem novos colaboradores
Maria de Fátima Martins on Prof. Jorge Santos terminou a viagem
margarida Pedroso de lima on Prof. Jorge Santos terminou a viagem
Manuel Henrique Saraiva on Como eu vi o “Prós e Contras” da RTP
Armando Manuel Silvério Colaço on Qual é a maior nódoa negra de Coimbra?
Maria de Fátima Pedroso Barata Feio Sariva on Encarnação inaugurou Coreto com mais de 100 anos
Isabel Hernandez on Lembram-se do… Viegas?
Maria Teresa Freire Oliveira on Crónica falhada: um ano no Fundo de Desemprego
Maria Teresa Freire Oliveira on REPORTAGEM / Bolas de Berlim porta-a-porta
Eduardo Manuel Dias Martins Aroso on Crónica falhada: um ano no Fundo de Desemprego
Maria Madalena >Ferreira de Castro on Crónica falhada: um ano no Fundo de Desemprego
Eduardo Manuel Dias Martins Aroso on INSÓLITO / Tacho na sessão da Câmara de Miranda
Ermenilde F.C.Cipriano on REPORTAGEM / Bolas de Berlim porta-a-porta
Eduardo Manuel Dias Martins Aroso on De onde sou, sempre serei
Carlos Santos on Revolta de um professor
Eduardo Varandas on De onde sou, sempre serei
Norberto Pires on Indignidade [Norberto Pires]
Luis Miguel on Revolta de um professor
Fernando José Pinto Seixas on Indignidade [Norberto Pires]
Olga Rodrigues on De onde sou, sempre serei
Eduardo Saraiva on Pergunta inquietante
mritasoares@hotmail.com on Hoje há poesia (15h00) na Casa da Cultura
Eduardo Varandas on Caricatura 3 (por Victor Costa)
Maria do Carmo Neves on FERREIRA FERNANDES sobre Sócrates
Maria Madalena Ferreira de Castro on Revalidar a carta de condução
Eduardo Saraiva on Eusébio faleceu de madrugada
Luís Pinheiro on No Café Montanha
Maria Madalena Ferreira de Castro on Eusébio faleceu de madrugada
José Maria Carvalho Ferreira on José Basílio Simões no “Expresso”
Maria Madalena Ferreira de Castro on Carta de Lisboa
Manuel Fernandes on No Café Montanha
Rosário Portugal on Desabamento na Estrada de Eiras
manuel xarepe on No Café Montanha
Jorge Antunes on Mataram-me a freguesia
António Conchilha Santos on Nota de abertura
Herminio Ferreira Rico on Ideias e idiotas!
José Reis on Nota de abertura
Eduardo Varandas on Caricatura
Eduardo Varandas on Miradouro da Lua
Célia Franco on Nota de abertura
Apolino Pereira on Nota de abertura
Armando Gonçalves on Nota de abertura
José Maria Carvalho Ferreira on Nota de abertura
Jorge Antunes on Nota de abertura
João Gaspar on Nota de abertura
Ana Caldeira on Nota de abertura
Diamantino Carvalho on Mataram-me a freguesia
António Olayo on Nota de abertura
Alexandrina Marques on Nota de abertura
Luis Miguel on Nota de abertura
Joao Simões Branco on Nota de abertura
Jorge Castilho on Nota de abertura
Luísa Cabral Lemos on Nota de abertura
José Quinteiro on Nota de abertura
Luiz Miguel Santiago on Nota de abertura
Fernando Regêncio on Nota de abertura
Mário Oliveira on Nota de abertura