A tragédia do Meco veio reacender o debate sobre a praxe académica. Inusitadamente, porque um grupo de jovens que decide passar um fim-de-semana numa praia dos arredores de Sesimbra nada tem a ver com a praxe académica. E se estiver errado, mostrem o “Código de Praxe” onde essa actividade está inscrita. O que se passou com os alunos da Lusófona – uma universidade autorizada em Março de 1998 e que ainda recentemente foi notícia pelo “caso Miguel Relvas” – poderá ter sido muita coisa; praxe académica é que não foi com toda a certeza, pelo menos do modo como entendemos a Praxe em Coimbra, onde existe uma universidade que tem séculos de existência e não apenas 14 anos.
A questão de fundo, no entanto, é outra. E é antiga: sempre que surge algum incidente no âmbito das praxes académicas, e eles podem acontecer nesta área como em qualquer outra da vida social, aparecem logo aqueles que (legitimamente) não gostam da Praxe e que defendem a sua extinção, tentando assim impor a sua vontade de forma anti-democrática. Os últimos dias têm sido férteis em atitudes destas, algumas mesmo patéticas, como os apelos ao Governo ou aos reitores para que proíbam as praxes.
A Praxe é uma emanação da vontade dos estudantes e só a estes cabe decidir sobre as suas formas, o seu futuro. Quanto muito, também os antigos estudantes terão uma palavra a dizer, no sentido de ajudar à reflexão, ao conhecimento das regras e à adequação de rituais centenários à realidade actual. Não se tenha a menor dúvida de que a Praxe não é tutelada, nem tutelável, por elementos estranhos à comunidade universitária.
A Praxe, em Coimbra, é muito mais do que um conjunto de rituais. A Praxe, em Coimbra, é parte integrante da própria História da cidade, da sua cultura, da sua identidade mais profunda. Coimbra não deixa de ser “do Choupal” apesar da Mata estar a agonizar há décadas. Também nunca deixará de ser a cidade da capa e batina, das serenatas, das latadas e do cortejo, apesar dos tratos de polé que estas manifestações têm sofrido nos últimos anos.
Coimbra e a Praxe têm uma ligação muito antiga. E não serão as vozes dos politicamente correctos, nem as vozes daqueles que tudo querem normalizar até que vivamos numa sociedade totalmente descaracterizada, falha de valores, História e tradições, também não serão estes que conseguirão romper um casamento de séculos.
A Praxe Académica de Coimbra é um património colectivo de gerações e gerações de Doutores e Futricas. Hoje ninguém terá coragem de “decretar” a sua extinção. Mas se alguém se atrevesse, Coimbra responderia como o fez no final da década de 70, saindo à rua, sem medo, defendendo inequivocamente aquilo que lhe está no coração. Melhor: que lhe está na Alma.
Concordo consigo.
a Praxe Académica de Coimbra procura e define uma personagem como deve ser uma pessoa inteligente e da cultura, ou seja, seguir a ideia fundamental dela torna-se um caminho para ser Um Homem / Uma Mulher. A incidente da Lusófona é falta desse aspecto, por isso não tem nada a ver com a nossa.
Espero que conseguimos divulgar, ou fazer entender na sociedade em Portugal o melhor e o correcto da Praxe Académica…
cumprimentos,
Sayuri Goda
Em meu entender, os pensadores – e quem se pronuncia verbalmente ou pela palavra escrita obriga-se a um pensamento mínimo – dividem-se, no geral, em dois grupos: os que “pensam” debaixo de emoções momentâneas e os que pensam num conceito de tempo que necessariamente abarca a razão.
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Eduardo Aroso
Acho que ofensivas são as generalizações e a mania das pessoas fazerem juízos de valor sem conhecimento de causa!
Isto para já não falar dos “cromos” anti praxe que todos conhecemos, que tentaram através da agressão física impedir a restauração das tradições em 79/80, e que são contra porque sim.
Ainda este ano passei os primeiros dias de aulas no Departamento de Engenharia e Computadores da UC, e a praxe que observei para além de inofensiva, inclui um serviço meritório prestado pelos alunos mais velhos aos caloiros, incluindo ajuda na criação da conta de aluno no sistema informático, explicação das regras básicas de funcionamento do departamento e outras burocracias, que para quem ali cai de para-quedas seriam um quebra cabeças sem ajuda. As “febradas”, o “traçadinho” e as cantorias também não têm nada de ofensivo. Mas Coimbra sempre foi uma lição!!!
Agora a praxe é bater na praxe.
Uma praxe que humilha e violenta, os muitos milhares que, agora sim, se sentem violentados e humilhados.
As palavras praxe e académico há muito que provocam anticorpos em muitos quadrantes. Quando juntas provocam, como todos os alérgenos, uma notória resposta excessiva de alguns sistemas imunitários.
O fulcro da questão em debate é o, profundamente lamentável, caso da morte de seis jovens na praia do Meco. Jovens que tinham como elo comum, o pertencerem a um estabelecimento de ensino superior. Esta ligação é o único elemento que, leva à extrapolação, de se tratar de um caso da tão famigerada praxe académica. Único porque, quem considerar que se está perante um exemplo, do que se passa em todas as academias, está a cometer o erro, que comete todo aquele que generaliza, o que não devia de deixar de ser, um caso bem particular, felizmente.
Um pequeno grupo de jovens, numa noite de lua cheia, a cumprir alguns rituais, tendo por companhia o esotérico Fernando Pessoa, indicia preferencialmente um qualquer culto, mais ou menos obscuro, do que uma praxe académica.
Uma das características da praxe académica, diferenciadora de muitas outras, é que ela só é praticável, no local/localidade do estabelecimento de ensino. Outra característica é que, há já algum tempo, ela nunca poderá ser humilhadora, nem violenta (a exemplo de Coimbra). Só assim se explica da existência de “jantares de curso”, a faceta mais concorrida do pós-praxe, ninguém regressa por vontade própria, a locais onde foi humilhado e violentado.
Há mais praxes (costumes, rotinas), sejam militares ou civis, sejam religiosas ou laicas que nunca foram assim escrutinadas.
O que me levou a expressar a minha opinião, foram dois factos, primeiro, o aproveitamento mediático, de todo um drama que envolveu aquele grupo, naquela infeliz jornada noturna. Aproveitamento que também se tornou uma praxe e que humilha e violenta como poucos outros. Segundo, a convocatória das academias para o Ministério da Educação, para discutirem “a praxe”, um acto que encerra em si uma extrema violência e humilhação, principalmente por ter lugar na altura em que se cortam nas bolsas, nas bolsas de investigação e se desinveste no ensino.
A discussão sobre a praxe vem mesmo a propósito, e muitos servem esse propósito, numa altura em que a discussão devia estar centrada, nas razões do abandono escolar e universitário. A situação de muitos estudantes universitário é que se tornou humilhante, com falta de dinheiro até para comer, fruto de uma política cega de cortes, essa sim uma praxe governamental, humilhadora e violentadora.
P.S. Verifiquei que muitos gostaram do comentário de Miguel Sousa Tavares: as praxes “são imbecilidades pró-nazis”. Comparar o incomparável é que é, penso eu, uma imbecilidade, principalmente no dia em que se comemorava o “Dia Internacional da Lembrança do Holocausto”, este sim fruto de uma imbecilidade nazi.