15.6 C
Coimbra
Segunda-feira, 4 Novembro, 2024
InícioDESTAQUE25 de Abril: compromisso com o futuro

25 de Abril: compromisso com o futuro [Norberto Pires]


video11

NORBERTO PIRES *

«Pode crer, miss Machado, que nunca encontrei ao longo do meu percurso um povo tão sensato como aquele a que você pertence. Um povo nobre, sem álgebra, sem letras, 50 anos de ditadura nas costas, o pé amarrado à terra, e de repente aparece um golpe de Estado, todos vêm para a rua gritar, cada uma com a sua alucinação, seu projeto e seu interesse, uns ameaçando os outros, corpo a corpo, cara a cara, muitos têm armas na mão, e ao fim e ao cabo insultam-se, batem-se, prendem-se, e não se matam. Eu vi, eu assisti. É esta a realidade que é preciso contar antes que seja tarde.», Lídia Jorge, “Os Memoráveis”

É verdade. Agora com a distância suficiente, a revolução portuguesa foi um evento memorável e muito significativo. Fomos capazes de uma transição sem sangue, com loucuras e abusos tristes, mas sem irreversibilidades, saímos de um ditadura de interregno de cabeça erguida, olhando em frente e sendo capazes, às vezes na nesga, de promover os caminhos certos. Mas, o que aconteceu desde 1974?

Porque falhamos no objetivo de construir o país que temos a capacidade de ser? Por que razão não fomos capazes de organizar o país para responder às necessidades das pessoas, e acima de tudo acordar um conjunto de objetivos que fossem comuns a todas as forças políticas? Por que razão não apostamos naquilo que nos poderia diferenciar, e desperdiçamos todos os apoios que fomos capazes de obter?

Por que razão é Portugal um país tão desigual de norte a sul e do interior ao litoral? Por que razão não desenvolvemos as políticas públicas certas, associando-as aos fluxos financeiros de que beneficiamos? Por que razão um país com estas gentes, com esta qualidade de território, com esta cultura, com estas tradições, com esta diversidade e qualidade de atividades, não foi capaz de se diferenciar e mudar a sua sina?

Isto anda sempre na minha cabeça. Um povo que foi capaz do 25 de Abril, ultrapassando todas as dificuldades e tendo a nobreza de não matar, estava encaminhado a ter o destino que afinal não teve. Se eu pudesse falar na cerimónia comemorativa do 25 de Abril na Assembleia da República era isso que diria.

Convidava muitas de pessoas para falarem comigo: atores, músicos e pessoas comuns: fazia algo como no vídeo cujo link vos deixo abaixo. E cantávamos. Os portugueses cantam sempre, mesmo nas situações difíceis. A palavra passe da revolução era uma cantiga de Paulo de Carvalho (“E depois do Adeus”), e a própria revolução têm na cantiga “Grândola, Vila Morena”, de José Afonso, um símbolo bem marcado. Muitas outras cantigas estão associadas a esse evento e ao seu espírito, pelo que basta uma simples melodia de passagem ou o trautear da letra para conduzir a nossa memória a esse dia de libertação.

O povo que fez o 25 de Abril não pode ter falido 3 vezes depois disso, sem tirar consequências. Não bate certo. Não pode pensar que os valores do 25 de Abril, ligados à solidariedade, à liberdade, à responsabilidade, à responsabilização, ao mérito, etc., são coisas vãs e dispensáveis.

Não pode ter do Estado a mesma ideia que se tinha na ditadura que todos rejeitamos. Por isso esse povo aceitou financiar, ser contribuinte, de um modelo de Estado que presta serviços comuns, garante a saúde, a educação, a justiça, o apoio social, etc., e gere os interesses comuns desenvolvendo políticas sufragadas em atos eleitorais regulares. É urgente perceber o que falhou e corrigir (reformar), porque mais do que uma mensagem de esperança o 25 de Abril é um compromisso de todos nós com o futuro.

NOTA: Este texto é acompanhado de um vídeo.

* Professor universitário. O autor escreve segundo as regras do novo AO.

web-Norberto-Pires

RELATED ARTICLES

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui

- Advertisment -

Most Popular

Recent Comments

Célia Franco sobre Redacção da TSF ocupada
Maria da Conceição de Oliveira sobre Liceu D. Maria: reencontro 40 anos depois
maria fernanda martins correia sobre Água em Coimbra 54% mais cara do que em Lisboa
João Vaz sobre Conversas [Vasco Francisco]
Eduardo Varandas sobre Conversas [Vasco Francisco]
Emília Trindade sobre Um nascimento atribulado
Emília Trindade sobre Sonhos… [Mário Nicolau]
Emília Trindade sobre Sonhos… [Mário Nicolau]
Américo Coutinho sobre “FDP” [Salvador Massano Cardoso]
José da Conceição Taborda sobre João Silva
António B. Martins sobre Qual é a maior nódoa negra de Coimbra?
Cristina Figueiredo sobre Encontro Bata Azul 40 anos
Maria Emília Seabra sobre Registos – I [Eduardo Aroso]
São Romeiro sobre Encontro Bata Azul 40 anos
maria santos sobre A carta de Ricardo Castanheira
Maria do Rosário Portugal sobre Ricardo Castanheira é suspenso e abandona PS
M Conceição Rosa sobre Quando a filha escreve no jornal…
José Maria Carvalho Ferreira sobre COIMBRA JORNAL tem novos colaboradores
Ana Maria Ferreira sobre Qual é a maior nódoa negra de Coimbra?
Maria Isabel Teixeira Gomes sobre COIMBRA JORNAL tem novos colaboradores
Maria de Fátima Martins sobre Prof. Jorge Santos terminou a viagem
margarida Pedroso de lima sobre Prof. Jorge Santos terminou a viagem
Maria Emília Gaspar sobre Qual é a maior nódoa negra de Coimbra?
Manuel Henrique Saraiva sobre Como eu vi o “Prós e Contras” da RTP
Luísa Cabral Lemos sobre Como eu vi o “Prós e Contras” da RTP
Eduardo Saraiva sobre Prós e Contras: porquê em Coimbra?
Armando Manuel Silvério Colaço sobre Qual é a maior nódoa negra de Coimbra?
Henrique Chicória sobre Qual é a maior nódoa negra de Coimbra?
Maria de Fátima Pedroso Barata Feio Sariva sobre Encarnação inaugurou Coreto com mais de 100 anos
Isabel Hernandez sobre Lembram-se do… Viegas?
Maria Teresa Freire Oliveira sobre Crónica falhada: um ano no Fundo de Desemprego
Manuel Marques Inácio sobre MARINHO PINTO candidato ao Parlamento Europeu
Maria Teresa Freire Oliveira sobre REPORTAGEM / Bolas de Berlim porta-a-porta
Eduardo Manuel Dias Martins Aroso sobre Crónica falhada: um ano no Fundo de Desemprego
Maria Madalena >Ferreira de Castro sobre Crónica falhada: um ano no Fundo de Desemprego
Eduardo Manuel Dias Martins Aroso sobre INSÓLITO / Tacho na sessão da Câmara de Miranda
Ermenilde F.C.Cipriano sobre REPORTAGEM / Bolas de Berlim porta-a-porta
Eduardo Manuel Dias Martins Aroso sobre De onde sou, sempre serei
Carlos Santos sobre Revolta de um professor
Eduardo Varandas sobre De onde sou, sempre serei
Norberto Pires sobre Indignidade [Norberto Pires]
Luis Miguel sobre Revolta de um professor
Fernando José Pinto Seixas sobre Indignidade [Norberto Pires]
Olga Rodrigues sobre De onde sou, sempre serei
Eduardo Saraiva sobre Pergunta inquietante
Isabel Hernandez sobre Hoje é dia de S. Cristiano Ronaldo
Leopoldo Serra sobre Ronaldo: alma portuguesa a chorar
mritasoares@hotmail.com sobre Hoje há poesia (15h00) na Casa da Cultura
Eduardo Varandas sobre Caricatura 3 (por Victor Costa)
Maria do Carmo Neves sobre FERREIRA FERNANDES sobre Sócrates
Maria Madalena Ferreira de Castro sobre Revalidar a carta de condução
Eduardo Saraiva sobre Aproveitar o lado bom do capitalismo
Eduardo Saraiva sobre Eusébio faleceu de madrugada
Luís Pinheiro sobre No Café Montanha
Maria Madalena Ferreira de Castro sobre Eusébio faleceu de madrugada
José Maria Carvalho Ferreira sobre José Basílio Simões no “Expresso”
Maria Madalena Ferreira de Castro sobre Carta de Lisboa
Manuel Fernandes sobre No Café Montanha
Eduardo Saraiva sobre Mau tempo em Coimbra (imagens TVI)
candido pereira sobre VERGONHA: Mondego ultrapassa margens
Ana Caldeira sobre Desabamento na Estrada de Eiras
Rosário Portugal sobre Desabamento na Estrada de Eiras
manuel xarepe sobre No Café Montanha
Jorge Antunes sobre Mataram-me a freguesia
António Conchilha Santos sobre Nota de abertura
Herminio Ferreira Rico sobre Ideias e idiotas!
José Reis sobre Nota de abertura
Eduardo Varandas sobre Caricatura
Eduardo Varandas sobre Miradouro da Lua
Célia Franco sobre Nota de abertura
Apolino Pereira sobre Nota de abertura
Armando Gonçalves sobre Nota de abertura
José Maria Carvalho Ferreira sobre Nota de abertura
Jorge Antunes sobre Nota de abertura
João Gaspar sobre Nota de abertura
Ana Caldeira sobre Nota de abertura
Diamantino Carvalho sobre Mataram-me a freguesia
António Olayo sobre Nota de abertura
Alexandrina Marques sobre Nota de abertura
Luis Miguel sobre Nota de abertura
Joao Simões Branco sobre Nota de abertura
Jorge Castilho sobre Nota de abertura
Luísa Cabral Lemos sobre Nota de abertura
José Quinteiro sobre Nota de abertura
Luiz Miguel Santiago sobre Nota de abertura
Fernando Regêncio sobre Nota de abertura
Mário Oliveira sobre Nota de abertura